sexta-feira, 18 de junho de 2010

Por que o brasileiro entra em euforia na época da Copa do Mundo?





Por Mariah Bressani

Parte I
Para quem é fã, o futebol desperta paixões e gera discussões, em muitas das vezes, bastante acalorada. A sua relação com este esporte não é, em absoluto, racional, ao contrário, é visceral.
No Brasil é possível observar esse comportamento, mais acentuadamente, quando acontecem os campeonatos estaduais, nacionais e mundiais. O brasileiro acompanha-os com paixão avassaladora, que o arrasta por turbilhões de sentimentos contraditórios, como alegria e tristeza ou vitoria e fracasso... E não existe meio termo!

É possível compreender essa paixão brasileira pelo futebol, ao se fazer um breve levantamento histórico, principalmente, quando da sua chegada ao Brasil.
Com o fim do trabalho escravo, em 1888, começaram a chegar os primeiros imigrantes europeus e em 1889 instaurou-se o regime republicano, rompendo definitivamente com a coroa portuguesa. Neste momento histórico, tornava-se uma nação de direito, sendo dirigida por brasileiros, porém, ainda sem identidade própria.
Podemos imaginar neste período, a turbulência e a falta de identidade própria: índios, negros alforriados e brancos expatriados, todos convivendo num país no qual não sentiam sendo “seu”. Apesar de quase quatrocentos anos de “existência” o Brasil ainda não era uma nação de fato!
Coincidentemente, nesta época, em 1894, Charles Miller retorna dos estudos na Inglaterra e traz para cá o futebol, num primeiro momento, esporte de elite e para a elite.

Entretanto, no século seguinte, pelos caminhos políticos e culturais percorridos pelo Brasil, tornou possível ao povo apropriar-se deste esporte que permitia a ludicidade e a "jinga" que só miscigenação brasileira pode imprimir ao esporte.
O futebol tornou-se, assim, neste último século da história do Brasil, o esporte nacional, que deu ao brasileiro um senso de identidade e de valor; já que, conforme este esporte foi crescendo em popularidade no país, o brasileiro foi também construindo e fortalecendo sua autoestima e seu autovalor, pois descobriu-se “bom” em algo, conseguiu também este reconhecimento pelas outras nações, ao importarem os “talentos futebolísticos” que foram despontando por todo Brasil.
Desta forma, é possível reconhecer como este esporte tornou-se parte da construção da identidade e fortaleceu a autoestima e o autovalor de “ser brasileiro”.


Parte II
Antes de entender o brasileiro e sua relação apaixonada com o futebol, é necessário, ampliar e compreender o próprio ser humano, como um todo.
O ser humano, desde sempre, precisou e procurou conectar-se com o divino e santificar sua vida. Além da sobrevivência, há duas questões que ocupa a mente do ser humano, que é o pertencimento e a identidade.

Questões como “Quem sou eu?”, “De onde eu vim?”, “O que estou fazendo aqui?”, “Para onde vou?”, sempre intrigaram o ser humano e, apesar das várias e diferentes respostas dadas pelo diversos pensadores desde a antiguidade, ainda hoje, o ser humano se inquieta, ainda não se sente respondido nestas questões existenciais.
Primeiro, por puro instinto, pela necessidade de sobreviver, aconteceu a união dos seres humanos, com a formação de clãs, proporcionando a sensação de pertencimento e promovendo sentimento de segurança e senso de identidade. Desta união em clãs, adveio a rivalidade com outros seres humanos, a necessidade de defender seu território e seus pares e, consequentemente, a guerra.

Assim, a partir da necessidade instintiva de sobrevivência e na sua ânsia em resolvê-la, construiu-se, dentro dos clãs, a sensação de pertencer e o senso de identidade no ser humano.
Na época da Copa do Mundo, todos os brasileiros, fervorosamente, estão unidos sob as cores do Brasil: não existem brancos, pretos, pardos, amarelos, pobres ou ricos, pois, todos pertencem ao mesmo clã, o Brasil, e são detentores de uma mesma identidade, ser brasileiro.
Portanto, no estádio de futebol, durante o jogo, simbolicamente, todos são irmãos, filhos “do mesmo pai e da mãe”, todos fazem parte do mesmo clã e, durante a partida de futebol, é o “clã brasileiro” contra o “outro clã”. É a questão da sobrevivência do clã que está em jogo. É sua identidade e sua supremacia que estão em jogo.

Deste modo, simbolicamente, campo de futebol torna-se campo de guerra, onde os jogadores brasileiros tornam-se os “nossos heróis”, os “nossos guerreiros”, lutando contra os “guerreiros deles”. Não é a torcida torcendo, empurrando o time para frente, para o gol; mas, sim, é cada um ali “junto” com seu “herói”, unidos, lutando contra o seu inimigo, como se fosse uma questão de sobrevivência.

O estádio é, também, simbolicamente, um templo.
O campo de futebol torna-se o "santuário", o "altar", onde o "ritual sagrado" acontece e os deuses se encontram para proteger seus adoradores do aniquilamento pelos outros deuses.
Durante o jogo, o estádio de futebol, simbolicamente, vira o "centro do mundo" e o ser humano estabelece comunhão com os deuses, representados pelos jogadores de seu time, de seu país. Neste momento, ele e os deuses, os jogadores, são Um. E um gol e, principalmente, a vitória, gera catarse coletiva, expulsando as tensões da vida mundana, fazendo-os vivenciar a sensação de ligação com o divino.

Sendo assim, no estádio de futebol, durante o jogo, o tempo para e o rito acontece: a comunhão com os deuses se estabelece e os demônios são exorcizados. E, assim, todos do clã são elevados a deuses – invencíveis e imortais.
Se qualquer jogo de futebol é vivenciado pelo ser humano como uma catarse, onde a guerra contra seus inimigos e o rito sagrado são vivenciados concomitantemente, promovendo renovação, numa disputa de Copa de Mundo, esta catarse é elevada a enésima potência.

Afinal, a Copa do Mundo, podendo ser compreendida como um evento simbólico e catártico, onde ali, não existe um “Eu”, pois, naquele “ritual” todos tornam-se uma única pessoa: são todos “um com o deus”; a vitoria, ali, lhes é consagrada devido à verdadeira comunhão com o divino, atualizando e renovando esta ligação e, consequentemente, garantindo a sobrevivência, o pertencimento, a identidade e a supremacia do clã vencedor.

Imagine, agora, sob esta perspectiva simbólica, o povo brasileiro, tendo em sua história o futebol e o senso de identidade, de autoestima e de autovalor tão mesclados, como a Copa do Mundo só poderia ser vivenciada, assim, com tanta paixão e euforia!


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imagem: Google

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sexta-feira, 4 de junho de 2010

Resgatando o Amor e a Ética nas Relações





Por Mariah Bressani

Os relacionamentos humanos estão em crise. Crise, porque está acontecendo grande transformação na forma de se desempenhar os papéis sociais, sejam papéis como pais, sejam como homem e mulher, e todos os outros. Crise, porque nesta transformação de papéis ainda não se sabe claramente o que pode ou não pode, o que é certo ou o que é errado fazer ou exigir numa relação. Entretanto, a pior de todas as crises é a crise moral e ética em que vivemos.
A coisa está tão séria que vemos explodir as denúncias de corrupção na política, a impunidade descabida correndo solta, vemos a violência desenfreada na sociedade humana a ponto dessa violência se infiltrar nos lares, perdendo-se todos os parâmetros. E em todas as situações sobra para nós, pobres mortais, somente a impotência!
Certamente que as informações estão chegando mais rapidamente até nós do que em outros tempo; mas, o que eu vejo são as crises dos papéis sociais gerando a crise moral e ética na sociedade (que já estava frágil!), trazendo, assim, cada vez mais em maior proporção, a violência para dentro dos lares e em todos os ambientes habitados pelos humanos.

As relações humanas tem o Amor como base para o seu pacto principal. Seja este Amor filial, fraternal, parental ou carnal. 
É o amor que aproxima as pessoas. A aceitação e a admiração são algumas das expressões deste Amor. 
Quando nos sentimos aceitos e admirados por alguém, nos sentimos amados e quando ainda por cima isso é recíproco, mais do que nunca queremos manter esta relação.

O grande problema é que só amor (o que já não é pouco numa relação) não basta, porque em nome deste amor que é dado, muitas vezes são exigidas contrapartidas que não são do direito e nem legitimadas pelo Amor. Percebemos as invasões dos espaços do outro em nome do Amor, sentimos o desrespeito em nome deste Amor. 
Portanto, além de Amor, uma relação não sobrevive sem o Respeito. É fundamental respeitar a individualidade do outro, bem como nos respeitar. É importante respeitar nossa individualidade na relação com o outro.

Outro ingrediente imprescindível em qualquer relação é a Confiança. 
Sem Confiança não investimos, não nos envolvemos e não nos entregamos em nada. Sem Confiança a relação fica estabelecida na superficialidade, sem nunca saber, realmente, com quem estamos, e quem está conosco não sabe, de verdade, quem somos.
Mas, para que haja Respeito e Confiança numa relação é absolutamente fundamental que haja Educação. E o que é Educação?

Eu chamo de se ter Educação quando a pessoa tem um mínimo de consciência de seus limites – direitos e deveres – enquanto Indivíduo, em toda e qualquer situação de vida, inclusive nas suas relações – ou seja, é fundamental noções básicas de Ética!
Hoje, é justamente pela deficiência de parâmetros claros e definidos de tais limites, que as pessoas estão muito mais autocentradas em suas próprias necessidades. Não estão conseguindo pensar no outro, nas necessidades do outro e, consequentemente, não confiam que o outro genuinamente possa fazê-lo também.

Estão todos vivendo pelo “princípio do prazer”, como diria Freud; porque lidar com a realidade simplesmente não é fácil.
As pessoas querem ter tudo, mas não querem dar nada! Pararam na fase dos três anos de idade: querem viver e experimentar tudo o que a vida se lhes apresenta, mas não querem assumir nenhum compromisso e responsabilidade sobre isso, como qualquer adulto saudável faria. Isto é princípio do prazer. Viver o bem bom da vida sem qualquer comprometimento de sua parte.
Está faltando – coletivamente – maturidade para viver a vida realisticamente. Falta o desenvolvimento de valores morais e éticos na relação com a vida e, consequentemente, na relação com as pessoas.

A vida e as relações humanas são feitas de direitos e deveres, mas se não existe um certo grau de desenvolvimento de valores éticos e morais – que eu chamo de Educação (porque é na educação recebida que se formam tais valores) – acaba por estabelecer-se contatos e relacionamentos pautados apenas nos “meus direitos” e totalmente inconsciente dos “meus deveres” – como qualquer criança de três anos de idade!
Por isto, é importante desenvolver a consciência de onde termina você e onde começa o outro.


Mas, quais são as suas necessidades e quais são as necessidades do outro dentro das relações?
Ter “noção” de ética e moral é o princípio sine qua non para se estabelecer qualquer relação.
Eu entendo por Ética como conduta de vida, onde sempre precisa estar presente um pensamento básico: “Tudo que me faz mal, que me incomoda, que me deixa infeliz ‘provavelmente’ poderá também afetar o outro e fazer-lhe mal, incomodá-lo e deixá-lo infeliz”.

Proponho à você um pequeno exercício: se eu tenho um relacionamento fixo com alguém e se me sinto atraído por outro alguém (o que é absolutamente natural que aconteça!), como devo proceder? Devo atuar com minha atração e me envolver em paralelo com esta outra pessoa?
Caso eu o faça, dentro dos parâmetros éticos – baseado no pacto de confiança e respeito dentro da relação (o que lhe seria próprio) – estaria eu traindo a confiança do parceiro fixo.
E se fosse o contrário: se meu parceiro fixo atuasse sua atração em paralelo à sua relação comigo, como eu me sentiria?

O problema é que a maioria das pessoas não faz este tipo de exercício ético: se colocar no lugar do outro.
E é isto que eu chamo de conduta ética: é saber que o que me atinge como indivíduo e ser humano, poderá atingir também o outro, como indivíduo e ser humano.

Independentemente do que a convenção social determina como modelo de atuação para os papéis que representamos (não podemos nos esquecer que a sociedade é formada por cada um de nós – portanto, somos nós que, verdadeiramente, determinamos os modelos dos papéis sociais a desempenhar), jamais devemos nos esquecer de que a base para a relação indivíduo<>indivíduo é a ética e a moral, que tem como princípio básico o Respeito e a Confiança. Caso contrário, o que teremos é uma banalização da Vida e, consequentemente, das relações que se tornam cada vez mais descartáveis. Todos se tornam descartáveis, porque falta amor e respeito à Vida, bem como falta a confiança de que a Vida proverá.

É importante que cada um de nós faça a sua parte para sair da impotência na qual socialmente entramos com a crise que se instalou: resgatar finalmente o Amor e a Ética, em princípio, na nossa própria vida e, depois, estender este “resgate” em todas as nossas relações. Precisamos entender que, realmente, depende única e exclusivamente de cada indivíduo expressar Amor e Ética na própria vida, nas relações pessoais e na sociedade humana de modo geral.


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imagens: unsplash e pixabay

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